Monstro Criativo
Sempre ouvimos que precisamos dar espaço para a nossa criança interna, certo?
Mas a nossa vida criativa é um lugar perigoso e poucos têm coragem de pisar nesse terreno minado.
Por quê?
A atitude infantil é bela em uma criança mas ridícula em um adulto.
Pelo menos é isso que a maioria das pessoas diz.
Eduardo é uma criança incrível e a sua imaginação é algo lindo de se ver em ação
Hoje, tive a grata surpresa de me ver montando uma fortaleza de Lego, enquanto ele se preparava para me atacar com o seu Godzilla que cospe plasma e tem um super rugido ensurdecedor.
E o que isso tudo tem a ver com vida criativa e cultura colaborativa?
Temos medo.
Temos muito medo.
Todos nós carregamos um cemitério na cabeça.
Somos assombrados diariamente por vozes que nos dizem o que fazer.
São essas mesmas vozes que ditam o ritmo da ansiedade nossa de cada dia.
A gente se esforça para aprender a fazer bem uma coisa e garantir que as outras pessoas vão gostar da gente, e que alguém vai nos pagar uma grana por isso.
Crescemos com um certo desconforto dos efeitos da palavra “surpresa”.
Ser criança é tão complicado para nós que desejamos ser adultos o mais rápido possível.
Sufocamos nossos instintos naturais para o improviso e a exploração, e trocamos tudo isso por ideias e coisas prontas.
Forjamos uma identidade tão artificial que perdemos o poder de nos valer da nossa própria essência.
Eu mesmo passei boa parte da minha vida tentando provar algo para o mundo.
Demorei a entender que a criação, isolada da troca sincera e generosa de ideias, não gera valor real.
De vida criativa sempre solo, aprendi o valor da colaboração na marra.
Como Dudu é muito mais experiente com as peças, logo que terminou de montar seu mostro ele se ofereceu para ajudar na construção da minha fortaleza que ele mesmo tentaria destruir.
E foi inspirador vê-lo atento aos detalhes mínimos, pois queria que tudo fosse perfeito.
Ele queria que a estrutura que estávamos construindo tivesse todos os recursos disponíveis.
E o mais interessante foi quando ele me disse: “esses pontinhos aqui são as pessoas, você vai ter que fazer tudo para proteger elas”.
Não era apenas uma brincadeira, eu tinha uma missão.
Tudo tinha um nome e uma função e nada podia existir sem propósito.
O garoto pensou no roteiro e na trilha sonora. Ele ligou o Youtube e colocou trechos das músicas originais pra garantir que a emoção fosse completa, e que cada cena estaria no tom certo.
E o homem adulto assistindo e aprendendo como se cria usando a imaginação?
Quando percebi, já tinha mergulhado de cabeça naquela odisseia titânica.
A mãe do Dudu, minha amiga Thaís, só olhava da mesa, rindo da gente, enquanto acalentava a sua mais nova, a Ane.
De repente, não era mais eu.
De repente, senti que aquilo ali não eram apenas pedaços de plástico e papel.
Era a melhor aula de criatividade que já tinha experimentado.
E aquele era o melhor professor do tema, pois ainda não tinha perdido o poder da sua imaginação.
Daí eu pensei: se eu aproveitar essa aula aqui de verdade, tanto eu quanto ele seremos pessoas muito melhores.
Percebi que tinha outra criança ali e fiz até sons de motores e explosões usando a boca.
Hotwheels eram naves espaciais e pilhas velhas mísseis nucleares. A mágica da imaginação livre prova que não existe ingenuidade, mas genialidade quando há disposição de criar juntos.
A beleza da criação não está no resultado, mas na colaboração que ela consegue desenvolver.
Hoje, eu percebi que preciso levar mais a sério todas as oportunidades que tiver para brincar com a minha imaginação.
A vida fica mais leve e meus projetos muito mais divertidos e valiosos!
Obrigado, professor Dudu!